A crise curativa - I

Pela nossa parte, fizemos a iniciação e o regresso à natureza, indo todos os dias almoçar e jantar à mesma sala onde a família se banqueteava com despojos cadavéricos e com vegetais cozinhados.

Havia então alguns tempos que não comíamos carne nem peixe, e agora não provamos alimento algum preparado ao fogo.

Não tivemos crises curativas fortes porque fomos procedendo devagar e com um certo critério.

Assim podem proceder as pessoas que sentem unicamente os defeitos das taras e os vícios da cozinha.

Mas os doentes agudos devem desde logo, iniciarem-se nas vantagens da dieta primordial para não dar aos micróbios pasto adequado, isto é, sangue tóxico.

A crise é, segundo Hipócrates, a eliminação de tudo quanto é supérfluo ou prejudicial ao corpo.

O regime alimentar cru, bem orientado, provoca lentamente a depuração, sem fazer sofrer em demasia o doente.

É porque a própria água, com os sais terrosos em dissolução, provoca nas artérias depósitos anormais.

Um ano depois de havermos iniciado a reforma íntima do organismo, tivemos uma descarga de ácido úrico.

Apesar de bastantes anos de dietas, o frugivorismo determinou mais íntima resolução libertadora.

O naturismo faz o que nenhum outro processo de higiene ou de medicina causa sobretudo no Verão.

Abençoada hora aquela em que, desprendidos de toda a ideia preconcebida, resolvemos iniciar a verdadeira alimentação. Reformar, eis a bandeira! Pôr um entrave à degenerescência, eis o fito. A crise curativa é necessária não só nos indivíduos como nas sociedades.

Os homens viciados tendem a expelir de si a toxicidade introduzida e formada. Uma doença é uma crise curativa, quando da forma aguda, porque, quem adoece depura-se.

A febre deve ser acolhida como um bom sintoma: respeitemo-lo convenientemente.

O jejum é óptimo. A disenteria é excelente para eliminar pelo intestino um sem número de resíduos mórbidos, contanto que não seja excessiva. Uma grande diurese é útil para que o sangue fique sem o menor resto de causas mórbidas.

Esta velha doutrina da natureza curadora, por muito tempo esquecida, é o eixo em que gira o naturismo moderno.

É a natura medicatrix a ideia mãe de todas as teorias patogénicas da época moderna, como afirmou o sábio professor Bouchard, da Faculdade de Medicina de Paris.

Felizes dos doentes que têm, a dirigi-los, médicos que conhecem a cura natural. Deixemos operar a natureza com as suas crises resolutivas e salutares, que expulsam do corpo os humores nocivos. A crise curativa é tanto maior quanto mais importantes forem os atentados antigos à integridade protoplásmica.