Princípios gerais da demência

Conviver com um doente demenciado é algo pesado, mas, de uma maneira ou de outra, devemos saber enfrentar o problema. E se não existem regras ou receitas de como tratar a pessoa demenciada, pelo menos podemos e devemos contar com certas ferramentas teóricas de como fazer a diferença nas diferentes situações que se nos apresentam.

1 – A demência não é uma perda total da memória

Embora se defina, muitas vezes, a demência como sendo uma deterioração global da memória, o intelecto e a personalidade, a qual pode resultar útil para propósitos clínicos práticos, o certo é que isto implica entender que todos os aspectos do funcionamento mental se encontram deteriorados. E isto não é certo. Tal acontece mais adiante, mas não nas fases precoces ou tão-pouco nas intermédias.

Há seguramente muitas coisas que já não funcionam como antes. No entanto, algo muito importante, que devemos ter sempre em conta, é que se um tipo de habilidade já não funciona, podemos utilizar outro tipo de sentido ou destreza.

Assim, por exemplo, se o sentido da audição não funciona, utilizemos então o da vista. O mesmo podemos fazer no caso inverso ou com os demais sentidos.

Tratar de manter e estimular as potencialidades de que a pessoa ainda goza é a melhor maneira de a manter viva e activa. Talvez não possa recordar muitas coisas, ou não possa falar ou expressar-se bem, mas o mais certo é que continue a gozar do prazer de ouvir música, ou talvez pintar, coser ou tecer… Daí que toda a actividade que possa ainda realizar deva ser estimulada e explorada.

2 – Desfrutar do prazer não requer memória

Quanta gente há que dizemos fazer-lhes falta inteligência para isto ou para aquilo, que como se esquecem das coisas…, que pouco cérebro ou fósforo têm…, mas muitas destas pessoas, como gozam a vida. E a verdade é que a gozam melhor que nós, os que supostamente pensamos, emitimos juízos ou temos uma inteligência superior aos demais.
A verdade é que para gozar a vida, não é preciso ser inteligente, muito menos ter boa memória. Sofrer de demência pode ser tremendo para muitos, mas tão-pouco o é para que vejamos a situação como o fim da nossa existência.

3 – O que se esquece e o que não se esquece

Todos nos esquecemos em maior ou menor grau. Não sendo nada de novo, é mais fácil que nos lembremos do que acaba de acontecer, o que ocorreu há duas ou três semanas, a menos que seja algo de muito importante. No entanto, no caso da demência, diz-se que a última coisa que aprendemos é o que mais facilmente esquecemos.

As palavras que acabam de nos dizer, o que aconteceu ontem ou as visitas da semana passada, depressa se esquecem, enquanto os factos ocorridos há mais de 20 ou 40 anos são lembrados com grande clareza.

A pessoa pode esquecer facilmente o que lhe disseram há cinco minutos, como que nesse dia vem comer lá a casa seu filho e sua nora e netos, ou que nessa mesma manhã uma sua neta a visitou. Não obstante, facilmente se lembrará do número do seu primeiro telefone, como do local onde trabalhava.
Poderá recordar com detalhe factos importantes da sua juventude, como viagens realizadas, pessoas da sua época, anedotas engraçadas e muitas mais coisas; no entanto, todo o recente fica completamente apagado no esquecimento.
Em relação a isto, existe um princípio, chamado “o primeiro que entra é o último que sai”. Este princípio pode ter grandes vantagens terapêuticas. E é na base deste pricípio que é recomendável estimular o doente com diversas actividades, mediante conversas que façam referência ao seu passado, mais que entreter-se no presente.
Pedir-lhe que conte algo da sua época. É muito interessante ver as mudanças de expressão que exprimem ao recordar factos agradáveis. É como voltar a viver.

Devem tentar-se vários tipos de jogos: cartas, dominó, damas, scrable ou outros de que gostem ou tenham jogado. Talvez – e isto não é certo – o doente tenha gostado dum tipo de música. Sintonizar o rádio numa estação onde toquem música da sua época, ouvir um disco e canções que apreciou, pode levantar-lhe o ânimo e fazer-lhe receber momentos agradáveis.