Características humanas - II

Outra grande dificuldade das experiências feitas com seres humanos está no facto de o observador e o objecto da experiência viverem ao mesmo ritmo. Os efeitos dum processo de alimentação, duma disciplina intelectual ou moral, transformarão política ou social são tardios.

Só ao fim de trinta ou quarenta anos é que se pode apreciar o valor dum método educativo.

A influência de dado factor sobre as actividades fisiológicas e mentais dum grupo humano não se torna manifesta senão passada uma geração.

Os sucessos atribuídos à sua própria invenção pelos autores de novos sistemas de alimentação, de cultura física, de higiene, de educação, de moral, de economia social, são sempre apregoados cedo de mais.

Só agora se poderiam apreciar frutuosamente os resultados do sistema Montessori ou dos processos de educação de John Dewei.

Devíamos esperar um quarto de século para conhecer o significado dos testes de inteligência feitos nas escolas pelos psicólogos.

É seguindo um grande número de indivíduos através das vicissitudes da vida, até à sua morte, que se conhecerá, e ainda de maneira não muito aproximada, o efeito sobre eles exercido por certos factores.

O progresso da humanidade parece-nos muito lento, porque nós, os observadores e passantes, fazemos parte do rebanho.

Cada um de nós só pode fazer um número reduzido de observações. A nossa vida é demasiado curta. Muitas experiências deviam ser prolongadas durante um século, pelo menos.

Deviam criar-se instituições em que as observações e as experiências começadas por um sábio não fossem interrompidas pela sua morte. Tais organizações são ainda desconhecidas no domínio científico.

É necessário suprir a duração demasiado breve da vida de cada observador por meio de instituições, de certo modo imortais, que permitisse, a continuação, tão prolongada quanto fosse preciso, duma experiência.

Certos dados, urgentemente necessários, podem ser adquiridos com o auxílio de animais cuja vida é muito curta.

Com este fim têm sido empregados sobretudo ratos.

Colónias compostas de milhares destes animais serviam para o estudo dos alimentos, da sua influência sobre a rapidez do crescimento, sobre a estatura, as doenças, a longevidade…

Infelizmente, os ratos não apresentam senão longínquas analogias com o homem.

É perigoso, por exemplo, aplicar a crianças as conclusões das investigações feitas sobre estes animais, cuja constituição é muito diferente da sua. Além disso, não se podem estender deste modo as modificações psicológicas que acompanham as variações anatómicas e funcionais sofridas pelo esqueleto, pelos tecidos e pelos humores, sob a influência da alimentação, do género de vida…

Pelo contrário, os animais mais inteligentes, como os macacos e os cães, permitiriam analisar os factores da formação mental.

Os macacos, a despeito do seu desenvolvimento cerebral, não se prestam muito às experiências. A sua genealogia não é conhecida. Não podem ser criados com facilidade nem em grande número. É difícil lidar com eles.

Pelo contrário, é fácil obter cães muito inteligentes, cujos caracteres ancestrais sejam exactamente conhecidos. Estes animais reproduzem-se rapidamente; tornam-se adultos num ano. A duração total da sua vida não vai, em geral, além dos quinze anos. Podem fazer-se sobre eles observações psicológicas muito minuciosas, sobretudo com os cães de pastor, que são sensíveis, inteligentes, vivos e atentos.

Graças a animais deste tipo, de raça pura, e em número suficiente, seria possível elucidar o tão complexo problema da influência do meio sobre o indivíduo.