Mitridatismo

Mitridates VII, o Dionísio, célebre rei do Ponto, conhecido pelas suas façanhas guerreiras, habituou-se, desde novo, a beber doses progressivas dos mais afamados venenos, com que era costume fazer desaparecer tiranos, naqueles bárbaros tempos.

E tanto se acostumou a esse lento envenenamento, que, robusto e hercúleo, amigo de jogos e de exercícios de todo o género, quando viu a sua estrela decair, tendo em vão procurado a morte nos mais atractivos venenos, pediu a um escravo para o matar a ferro, visto que pelos filtros ingeridos a morte tardava a chegar.

Pois bem, esse facto histórico tem uma correlação intensa com os hábitos alimentares usados neste século de vícios refinados.

Desde a mania do ópio, que, vinda do Oriente, invade a Europa, à fobia da morfina, que já tem tantos amadores entre nós.

Desde o chá que, como o café, excita o sistema nervoso, até ao álcool, que fere a integridade do carácter.

Desde o tabaco entorpecedor, que se fuma, masca e cheira, até à carne putrefacta, cheia de purinas, tão usadas pelas classes abastadas, estamos assistindo a contínuos mitridatismos.

Hoje, todas as pessoas que usam o fósforo ou o arsénio, a estriquinina ou a nicotina, a cafeína ou a musculina e todos os demais alcalóides, vão definhando dia a dia, de modo que se encontram muitas pessoas que aos trinta anos são calvas, doentes e velhas.

Porquê? Porque são indolentes, não expulsam do sangue esses tóxicos diários, e não se reintegram na vida simples.