Fronteiras físicas

Sabemos que a pele, por um lado, e por outro, asa mucosas digestivas e respiratórias constituem as nossas fronteiras físicas.

Da sua inviolabilidade estão dependentes a nossa integridade anatómica e funcional, e a nossa sobrevivência.

A sua destruição e a invasão dos tecidos pelos micróbios provocam a morte e a desintegração do indivíduo.

Mas sabemos também que elas se deixam atravessar pelos meios cósmicos, pelas substâncias químicas que resultam da digestão intestinal das matérias alimentares e pelo oxigénio da atmosfera, pelas vibrações da luz, do calor e do som.

É graças a elas que se estabelece a continuidade entre o nosso corpo e o mundo exterior. Mas esta fronteira anatómica é apenas a dum aspecto do indivíduo; a nossa personalidade mental não é limitada por ela.

O amor e o ódio são realidades que nos ligam de maneira positiva a outros seres humanos, seja qual for a distância que deles nos separa.

Uma mulher sofre mais com a perda do seu filho do que com a amputação dum dos seus próprios membros.

A ruptura duma união afectiva leva por vezes à morte. Se os laços afectivos e imateriais fossem visíveis, os homens aparecer-nos-iam sob aspectos novos e estranhos. Uns mal excederiam a superfície da pele. Outros, prolongar-se-iam até ao cofre dum banco, até aos órgãos sexuais doutro indivíduo, até a alimentos, a bebidas, por vezes até a um cão, a uma casa, a objectos de arte. Outros, aparecer-nos-iam imensos e prolongar-se-iam em numerosos tentáculos, que iriam ligar-se aos membros da sua família, a um grupo de amigos, a uma velha casa, ao céu e às montanhas do país natal.

Os condutores de povos, os grandes filantropos, os santos, seriam gigantes estendendo os seus múltiplos braços por sobre um país, um continente, o mundo inteiro.

Há uma estreita relação entre nós e o nosso meio social. Cada indivíduo ocupa certo lugar no seu grupo, grupo ao qual o prende um laço real.

Este lugar pode parecer-lhe mais importante que a própria vida. Se a ruína, a doença, as perseguições dos seus inimigos o privam dele, sucede por vezes que prefira o suicídio a essa mudança.

É evidente que por todos os lados o indivíduo ultrapassa as suas fronteiras corporais.